domingo, 1 de setembro de 2013

TRISTEZA vs DEPRESSÃO: A DIFERENÇA ENTRE O NORMAL E O PATOLÓGICO



Em tempos em que os termos médicos e científicos tornam-se conhecidos pela comunidade, observamos um efeito colateral inevitável: a banalização e generalização dos diagnósticos psiquiátricos. Se por um lado, é fantástico que mais pessoas saibam que existe uma doença chamada Depressão, por outro corremos o risco de, de repente, toda tristeza da vida passar a se chamar “Depressão”. E se TODA tristeza é Depressão, nenhuma acaba sendo levada a sério. Principalmente as “verdadeiras”.

Então, agora que os amigos de João ouviram falar em Depressão, João não está triste, João está deprimido. E segundo seu amigos, se João está deprimido, João precisa de remédios. Isso assusta João, ou então o envergonha, então João sequer cogita a possibilidade de ir ao médico. Bem, talvez João precise de remédios, talvez não. Talvez João esteja genuinamente triste por ter se divorciado no mês passado, como qualquer pessoa do planeta ficaria. Sua vizinha Maria também está triste – seu cachorinho morreu atropelado. Há 3 anos. E Maria continua triste. Maria não consegue superar esta perda.

A tristeza de Maria é normal, ou patológica? E a tristeza de João? Como você pode saber se sua tristeza (ou a do vizinho) é passageira, ou se veio pra ficar e requer cuidados médicos?

A resposta mais óbvia é que você deveria procurar um médico. Afinal, o diagnóstico de uma doença cabe aos médicos. Mas muitas vezes o dilema se forma antes disso: quando é a hora de procurar um médico?

A tristeza é um sentimento comum, presente na vida de qualquer ser humano. Ela é uma emoção perfeitamente adequada a situações em que existam perdas, conflitos, decisões, mudanças, frustrações. Ficar triste é normal, mas, via de regra, a vida trata de trazer outros eventos significativos, outros prazeres e felicidades, e comumente uma dor é superada e a vida continua. Mas e permanecer triste? Seria essa a fronteira entre normal e patológico? Uma tristeza que não passa?

Quando falamos em Transtorno Depressivo, estamos falando de uma Síndrome: um conjunto de sinais e sintomas. Não basta estar triste para estar deprimido – precisa ter uma série de sintomas, característicos da Depressão. Variáveis como duração, intensidade, alteração nos níveis de vitalidade, funções fisiológicas e cognitivas, e prejuízo no funcionamento global do indivíduo são os parâmetros atuais para se diferenciar a tristeza normal da Depressão. Quer dizer: há quanto tempo você se sente triste? E quão triste você se sente (você tem ideias de suicídio, por exemplo?)? Você não está triste, mas tem se sentido cansado, sem disposição para as tarefas cotidianas? Não sente mais prazer em nada? Sua memória anda prejudicada? É difícil prestar atenção nas coisas? Você se afastou da família ou amigos? Não dorme? Ou dorme demais?

Essas perguntas, bem como muitas outras, ajudam a delinear e a fechar um diagnóstico mais ou menos preciso. Grosso modo, pode-se sintetizar: se sua tristeza é desproporcional à situação que a deflagrou, dura tempo demais, e altera seu comportamento significativamente, você pode estar deprimido.

Voltemos a João: ele está triste porque se divorciou. Mas consegue trabalhar normalmente, e gradativamente, conforme os dias passam, ele consegue ter momentos felizes. Claro, demora algum tempo para ele estar de volta aos happy-hours da empresa em que trabalha, às vezes fica desanimado, mas no geral, João “funciona bem”. Logo, João não parece atender aos critérios para Depressão. Sua tristeza “passou”. Mas sua vizinha Maria, desde que o cachorro morreu, 3 anos atrás, sente-se triste a maior parte do tempo, quase todos os dias. Não tem vontade de fazer nada: fica em casa o tempo todo, tem dificuldade para dormir, não quer ver os amigos, não se arruma mais. Na verdade Maria se sente tão mal, mas tão mal, que abandonou seu emprego e perdeu quase 10kg, porque não sente mais vontade nenhuma de comer.

Maria tem um quadro diferente do de João. Ela teve uma alteração nítida de comportamento, e várias de suas funções fisiológicas se alteraram (o sono, o apetite, a disposição física). A duração de seu luto pelo cachorrinho é longa demais, desproporcional ao evento. Esses são os sinais indicativos mais nítidos de que Maria tem um Transtorno Depressivo.

Diagnosticar uma Depressão não é uma tarefa simples – exige uma investigação detalhada e minuciosa do quadro atual do indivíduo. Mas mesmo antes de chegar ao médico, muitas pessoas não se atentam para o que realmente significa uma Depressão, ou ao contrário, subestimam seus sintomas e passam muitos anos em sofrimento e sem buscar ajuda médica, especialmente devido ao preconceito e ao estigma social que a Depressão carrega.

Isso se torna especialmente perigoso no caso da Depressão, pois é a doença que mais incapacita pessoas no mundo, estando à frente das doenças cardíacas, neurológicas e oncológicas. Estima-se que 18% da população mundial sofra de Depressão, o que significa, atualmente, mais de 1 BILHÃO de pessoas!

Portanto, se você suspeita que você (ou seu conhecido) possa estar deprimido, atente-se para estas variáveis:

·         Humor deprimido: sentir-se deprimido a maior parte do tempo, por um período de tempo prolongado;
·         Interesse diminuído ou perda de prazer para realizar as atividades de rotina;
·         Sensação de inutilidade ou culpa excessiva;
·         Dificuldade de concentração ou de memória;
·         Cansaço excessivo e perda de energia;
·         Alteração de sono: insônia ou hipersonia (dormir demais)praticamente diárias;
·         Problemas psicomotores: agitação ou lentificação (observado por outros);
·         Perda ou ganho significativo de peso, sem estar de dieta alimentar;
·         Ideias recorrentes de morte ou suicídio. 

Se estas variáveis estiverem presentes, e alteradas, de maneira significativa, não hesite em procurar um médico ou em estimular seu conhecido para que ele o faça. Um médico competente será capaz de realizar o diagnóstico e fazer a prescrição terapêutica.

Atualmente, os melhores resultados em tratamentos para Transtornos Depressivos são encontrados a partir da combinação de medicamentos e psicoterapia (em especial a Terapia Cognitivo-Comportamental), e estes serviços estão disponíveis inclusive na rede pública de saúde. Você pode ir ao posto de saúde mais próximo de você, por exemplo.

O mais importante é não deixar uma suspeita passar em branco – se você acha que pode estar deprimido, verifique! Melhor voltar do médico com as mãos abanando e nenhum diagnóstico, do que levar anos e anos de sofrimento até recebê-lo =)




Um comentário:

Anônimo disse...

Muito elucidativo seu texto.
Agradeço por compartilhar seu conhecimento.
Namastê
Vanessa Silva